“Meu conselho é confiar em você, chorar tudo o que tem pra chorar no tatame, afinal a gente ainda é mulher, né? TPM, essas coisas, humor, oscilações.
Passe todas as dificuldades dentro do tatame, mas sempre fortalecendo o corpo, o espírito confiante, pegar músicas que você gosta, aquelas que tocam seu coração, textos, mensagens positivas, tudo aquilo pra te deixar sempre positiva, sempre pra frente, afinal o universo conspira as nossas energia.
Acho que é isso, sofrer o que tem pra sofrer no tatame e na hora acreditar, porque sonhos foram feitos pra virar realidade e os seres humanos para quebrar barreiras e superar limites!”
Tainara Lisboa
Oi, gente!
Uma coisa legal que tem acontecido desde que eu anunciei que vou lutar é que todos têm algum conselho pra me dar, seja pra eu ficar mais tranquila ou alguma técnica pra anular a oponente.
Sinto isso quase como um carinho, uma preocupação de amigos e conhecidos.
Numa dessas, o Iago, meu ‘irmãozinho’ de equipe, começou a me contar sobre a biografia do Mike Tyson que lera há pouco.
O livro conta que antes de sua primeira luta, Tyson estava tão apavorado que quase pegou um trem pra ir embora da cidade que ia lutar.
Às vezes os conselhos e as dicas vêm em forma de relato de experiência, então não é direto, mas a mensagem está lá. Tem um cara, Jorge Larossa, que diz que experiência não é o que se passa, o que acontece, ou o que toca. “É o que nos passa, o que nos acontece, o que nos toca.” O que atravessa a gente. Então imagina se algo que transformou alguém não pode ser uma lição para outra pessoa.
E é lindo ver como as pessoas tem dividido isso comigo: como fizeram, o que fizeram, o que erraram ou o que mudariam em sua primeira luta, para que eu consiga tirar algum aprendizado. E é óbvio, sempre dá pra tirar alguma coisa.
Então pra essa postagem eu decidi perguntar para 5 lutadores como foi a sua primeira luta.
São eles: Denis Vanzelli da Steel Team, com quem eu tenho dividido alguns treinos, Anderson Portugal da Mahd Team, que conheci através deste blog, Istela Nunes, campeã mundial 54 kgs em Bangkok – Tailândia, Tainara Lisboa da Thai Center, bi campeã mundial também na Tailândia, e Jós Mendonça, campeão do Rajadamnern Stadium, o estádio mais antigo de Bangkok e um dos mais respeitados do mundo.
Espero que gostem e que consigam tirar algum aprendizado dessas experiências também!
DENIS VANZELLI
“Bom, a primeira luta a gente nunca esquece, né?
A minha foi na própria academia onde eu treinava e contra um colega de treino há uns 6 anos atrás. Além de colega de treino era um cara com quem eu conversava e tinha amizade, o Bruno Roma. Só que quando subimos no ringue, a torcida estava toda com ele… isso me desconcentrou um pouco. Eu nunca tinha lutado num ringue e tinha voltado a treinar há pouco tempo, mas eu sabia que podia derrubar alguém na porrada… rs. Eu estava confiante e parti pra cima com tudo, mas o Bruno era muito resistente e meu gás não durou. Lutamos os três rounds seguintes mas perdi por pontos.
Depois de algumas outras lutas no Brasil, veio a estreia na Tailândia.
Eu queria muito estar ali, mas por uma questão de adaptação ao horário e cansaço da viagem, conseguimos treinar apenas 3 dias, não me sentia pronto. O Adaylton Freitas lutou antes de mim e desceu do ringue com 3 cortes no rosto e ele havia vencido a luta. Isso me abalou um pouco também. Deixei tudo pra lá e coloquei meu coração no ringue. Minha cabeça não servia naquela hora! Entrei nervoso mas lutei 5 rounds. O adversário era alto, com mais de 100 lutas… conhecia muito o jogo e eu só tinha a garra naquela hora. Cansei no 4º round e os juízes não perdoaram. Vitória pra Tailândia e mais uma lição pra mim.
De volta ao Brasil, subi de novo num ringue aqui e não me assustou nada. Mais uma vitória por nocaute.”
ANDERSON PORTUGAL
“Com 6 a 7 meses que iniciei no Muay thai, recebi um convite para estrear em uma luta.
Medo e ansiedade foi o que senti, mas aceitei.
Acho que como muitos aqui no Brasil, minha estreia foi nas regras de k1, pesagem no mesmo dia da luta, sem uma calibração controlada de peso entre os atletas e só conheci o adversário e sua equipe no dia.
Fiquei um pouco com receio mas meu treinador, Marcos Aurélio “Marcão” , entrou na minha mente e me deixou focado na luta, deixando o medo de lado.
A sensação de entrar no ringue a primeira vez pra mim foi de apavoro, a única certeza que eu tinha é que eu era meu único representante naquele momento, e que o momento tinha que ser meu .
Começou a luta e recebi muitos chutes fortes na perna esquerda, mas durante a luta criei uma frieza, esqueci a dor e inseri em minha mente o que eu fazia nos treinos e soltando durante a luta.
Lembro em me manter firme no meio do ringue e só ir pra frente em contra ataques técnicos e firmes.
E apesar daqueles chutes fortes que recebi , consegui a vitoria por pontos sendo duro, técnico e mais completo .
Foi a sensação mais satisfatória da minha vida.
Acredito que a primeira luta, o maior desafio é em você enfrentar algo desconhecido, uma sensação de medo, ansiedade, pressão , que mexe muito mais com sua mente do que com seus músculos. Onde você realmente chega aos seus limites, mas só vence se ultrapassá-los.
O pós luta, resultou uma perna luxada atestado de 5 dias no trabalho mas um sorriso no rosto e a certeza do que eu queria pra mim até hoje.”
ISTELA NUNES
“Na minha primeira luta, fui pega de surpresa pois tinha apenas 4 meses de treino e como era muito nova – 11 anos de idade – fiquei bem ansiosa.
Mas ao subir no ringue foi uma sensação incrível e felicidade, pela idade nem senti o gás, quando se é criança tudo vira eterno.
Subir ao ringue nos ensina muita coisa boa, respeito, dignidade, disciplina e etc.
Na época eu subia por hobby, hoje por amar o que faço e por profissão, então é muita responsabilidade pra honrar meus títulos, meu nome, minha equipe e meu país. Ganhei minha primeira luta por unanimidade, lutei em um campeonato interno de academia a convite do meu primeiro mestre Ademir Mori, foi uma luta um pouco difícil pela adversária ter 10 kg a mais que eu, mais soube administrar a luta e sair com a vitória.
O conselho que dou, é sempre correr atrás de seu objetivo e sonhos e nunca desistir, mesmo que a primeira tentativa não dê certo. E uma frase que sempre levo comigo é: “E se tiver medo, vai com medo mesmo!”
TAINARA LISBOA
“A minha primeira luta eu me senti muito bem preparada.
Acredito que toda parte da insegurança e do medo ficaram no treinamento. Como todo mundo sabe, o Sandro não brinca em serviço, os treinos foram bem árduos, bem fortes. Independente se for a primeira ou a vigésima luta vai ser duro, então quando eu cheguei no dia eu estava bem preparada, confiante pronta pra o que viesse enfrentar.
A ansiedade sempre existe da primeira luta até hoje, é algo inevitável: afinal é perder ou ganhar, é algo bem importante ainda mais pra alguém como eu, bem competitiva. Mas a gente controla, acho que eu tento controlar a ansiedade ao focar em trabalhar mais e mais forte. Mas acredito que antes, nos treinamentos, eu fiquei bem ansiosa porque era primeira vez que me submetia a ser atleta, algo bem intenso, me deparar com cobranças, superação. Tanto que no dia da luta eu estava numa ansiedade empolgada, sabe? Ansiedade de não ver a hora de acontecer, de ver como é subir no ringue, de ver se todo o esforço daqueles dias passados iam valer a pena.
Na época eu tinha 16 anos, estreei num evento da FEPLAM, lutei com uma menina maior de idade, mas mantive meu gás do começo ao fim. Foi uma luta muito boa, tanto é que entre200 atletas, homens e mulheres, eu fui eleita a melhor atleta do evento. Acho que estreei com o pé direito.
Mas o psicológico é o fator principal, como eu costumo dizer pras pessoas, não existe se eu ganhar, você vai ganhar! A confiança é importante porque se você não acreditar em você, quem é que vai acreditar? Se você não confia no que você faz, no seu treinamento, nas pessoas a sua volta, como é que você vai conseguir se sentir um vencedor? Óbvio, sempre com respeito e humildade, não é uma confiança pra desrespeitar a pessoa que está te enfrentando e sim uma confiança em você, no que você fez, batalhou. Confiança é muito importante, não só na luta, mas em toda a vida é a primeira coisa que tem que ser preparada. E nesse caso, a gente prepara bastante, a gente costuma dizer que as lutas são nos treinos pra luta mesmo ser um treino.
A primeira luta mudou o rumo da minha vida, eu realmente tive a certeza do que eu queria pra mim, eu conheci uma Tainara que antes eu nunca tinha visto. Conheci uma menina muito mais forte, corajosa, guerreira, alguém que tinha um lugar no mundo. Talvez por isso minha paixão e talvez por isso eu tenha seguido uma carreira tão legal. E não só a primeira luta, mas todas as outras vieram me transformando cada dia mais.”
JÓS MENDONÇA
“Minha primeira luta aconteceu aos meus 18 anos.
Bom, o que eu lembro era que estava me sentindo fraco porque a pesagem foi quase na hora da luta e eu fiz a besteira de ficar sem comer direito.
Outro fator foi que estava muito nervoso pois todos meus amigos de colégio e de treino foram ver e esperavam que eu fosse arrebentar pois, na verdade, treino desde 7, 8 anos, karatê, taekwondo… Sempre fui competidor desde muito novo. Meus pais sempre me fizeram competir em tudo que aparecia. Por conta disso muitos amigos esperavam muito de mim.
Mas o que na verdade aconteceu, foi que morri no gás com 30 segundos de luta e também perdi o controle mental e físico, meu coração parecia que ia sair pela boca. Tipo nervoso e cansaço ao mesmo tempo.
Acho que a única coisa que teria feito de diferente seria comer mais e só… porque acho que a primeira luta é apenas um teste. Não adianta fazer estratégia pois as emoções vão falar mais alto.
No final, a luta foi empate.”
Com esses e outros depoimentos, chego a conclusão da importância em estar não só preparado físico e tecnicamente, mas principalmente no psicológico. Segundo os relatos acima, a regra é: se você está tranquilo, há mais chances de vitória.
Por conta disso, não consigo deixar de lado a preocupação com a ansiedade, o nervoso, a falta de gás… fico pensando que na hora não vou conseguir raciocinar devido a adrenalina.
Mas retornando ao livro sobre o Tyson, o Iago também me contou que a descarga de adrenalina no meu corpo será inevitável, e acrescentou: “sabe quando um animal consegue fugir com toda velocidade de seu predador? Ele só consegue fugir daquele jeito por conta da adrenalina. Então, use-a a seu favor também.”
Não pra fugir, né? Mas pra ganhar!
🙂
Um beijo,
Japa.